A primeira semana de abril registrou uma queda de dois dígitos no preço do Bitcoin, momento em que grandes investidores internacionais sacaram cerca de $240 milhões de dólares de fundos cripto, segundo o relatório semanal da CoinShares. Na contramão, os aportes vindos do Brasil somaram $1,4 milhões de dólares, algo em torno de R$8,2 milhões.
Isso reafirma o hábito dos brasileiros de “comprar o mergulho” quando a volatilidade aperta. E essa disposição para o risco não se esgota no Bitcoin. Hoje em dia os investidores também estão buscando meme coins promissoras para comprar pequenas fatias do portfólio com ativos de comportamento explosivo.
O fluxo de R$8,2 milhões foi concentrado em produtos atrelados ao Bitcoin, mas relatórios de mesas de operação local indicam um aumento de 14% no volume negociado de tokens menos conhecidos entre 3 e 9 de abril, período imediatamente posterior à correção. Valores unitários baixos criam a impressão de alta capacidade de multiplicação.
Sem nem completaram um semestre de listagem, algumas dessas moedas digitais já acumulam valorizações de três dígitos. Quem decide se expor, no entanto, costuma fazê-lo com percentuais inferiores a 2% do capital total. Esses ativos se comportam menos como reservas de valor e mais como termômetros do humor do varejo.
Fluxo global vira positivo, mas o Brasil já antecipava isso
Três semanas depois, o sentimento mundial inverteu. Os produtos de investimento em criptoativos receberam $2 bilhões de dólares em entradas líquidas, elevando o total sob gestão para $156 bilhões de dólares, o maior patamar desde fevereiro. Os Estados Unidos responderam por $1,9 bilhão de dólares desse fluxo.
Já a participação brasileira manteve o caráter pontual, oscilando entre leves saídas de R$3,4 milhões no fim de abril e resgates menores, de R$1,1 milhão, na virada para maio. Mesmo com as idas e vindas semanais, o saldo anual do Brasil permanece positivo em $73 milhões de dólares.
Esse dado sustenta a sexta colocação do país no ranking mundial de fundos cripto por ativos sob gestão. O contraste com as retiradas volumosas vistas na Alemanha e na Suíça mostra como o investidor brasileiro, acostumado a ciclos abruptos de preço no mercado doméstico, tende a enxergar na queda um custo de oportunidade, em vez de um alarme vermelho.
Dois fatores macroeconômicos ajudam a explicar por que parte desse capital foi redirecionada para fundos de criptomoedas em pleno aperto monetário. O primeiro é a Selic a 14,75%. O Banco Central elevou os juros básicos ao maior nível desde 2006 na reunião de 7 de maio, num esforço para conter a inflação projetada de 5,49%.
Embora isso encareça o custo de oportunidade, a renda fixa em patamar tão alto gera liquidez extra para investidores institucionais que procuram diversificação. O segundo fator é o real fortalecido. O câmbio próximo de R$ 4,65 por dólar, fruto do superávit comercial recorde no primeiro trimestre, barateou o preço dos índices cripto cotados em moeda forte.
Na prática, a queda do Bitcoin em dólares foi amplificada no Brasil, tornando a alocação proporcionalmente mais barata para quem entra com reais. Além disso, o marco legal das criptomoedas (Lei 14.478/22) completou dois anos em vigor, oferecendo regras mais nítidas para custodiante e gestor de veículos de investimento.
O resultado é uma disposição maior de “dinheiro institucional doméstico”, fundos multimercado e previdenciários, a empilhar exposição de longo prazo sem esbarrar em incertezas regulatórias.
Educação financeira e gestão de risco seguem no centro do jogo
O giro rápido entre resgates e aportes, comum no Brasil, sublinha a necessidade de informação de qualidade. Materiais sobre investir em cripto com segurança trazem orientações sobre custódia própria, uso de autenticação de dois fatores e segregação de carteira fria para reduzir o impacto de oscilações severas ou eventuais falhas de exchange.
Tais boas-práticas fazem diferença sobretudo em ciclos de forte turbulência. No trimestre encerrado em março, 11 das 50 exchanges com maior volume no país tiveram interrupções de negociação superiores a 30 minutos durante picos de liquidez, segundo auditoria da Blockdata.
Embora nenhuma falha tenha provocado perdas permanentes, a paralisação expôs a importância de estratégias simples, limites de perda, rebalanceamento periódico, reserva de liquidez fora da corretora, para quem não deseja transformar cripto em fonte de renda, mas sim em ativo satélite de diversificação.Sem conclusão fechada, fica a interrogação que movimenta mesas de operação desde 2020. A correção do Bitcoin abriu novo ciclo de oportunidade ou foi apenas um desvio numa trajetória maior de incertezas? Enquanto Wall Street debate a resposta, o investidor brasileiro parece manter viva a tradição de buscar preço “na promoção”, ciente dos riscos, mas convicto de que a história do mercado cripto ainda está longe de terminar.